sábado, 21 de março de 2015

O primeiro dia de Pedal

Todos estávamos muito ansiosos com a expectativa do primeiro dia de pedal. Os sintomas eram claros, a todo instante um ia ao banheiro, a comunicação demostrava grande excitação e mesmo a insônia bateu em alguns.

Saímos de El Calafante por volta das 10h30, uma hora a mais do que havíamos previsto. Logo de cara notamos que Del não nos acompanhava. O que será que havia acontecido!? Esta pergunta passou pela cabeça de todos. Logo lembramos que havíamos marcado para tirar umas fotos na saída da cidade e, possivelmente, Del estaria por lá. Dito e feito. Só que ao chegarmos no ponto avistamos apenas a bike de Del. Bem, o nosso parceiro tinha ido ao mato por conta de uma dor de barriga.

Ainda na saída da cidade, onde paramos para tirar uma foto, estaciona um carro e dessem duas mulheres se oferecendo para tirar fotos. É claro que foi aquela esculhambação, principalmente porque Del tirou onda com as mulheres. Elas eram da prefeitura, possivelmente ligadas a algum grupo político. Segundo elas, o que havia chamado atenção eram as nossas camisas oficiais da viagem (cor laranja). Ao final, elas tiraram uma bandeira (laranja) e fizemos todos uma foto. Exercitamos a "nossa política internacional".

Prosseguimos com a nossa missão de rodar, mais ou menos, 70km, pois a ideia seria não forçar nos primeiros dias. Tivemos sorte na largada, pois pegamos o vento ao nosso favor. A velocidade dele estava, em média, a 30km. O que é, para os parâmetros da Patagônia, uma brisa.
A paisagem era inapreensível, linda demais. Aquele descampado todo marrom, árido, inóspito, um vale a nossa esquerda,  um rio que margeávamos de longe e ao fundo, o lago de El Calafate, enorme. O céu... aquele azul claro próprio da bandeira da Argentina.

Depois de uns 44 km rodados, paramos para lanchar na beira de um riacho, com uma ponte em frente e com uma vegetação que nos protegia do vento. Lanche feito, de volta a pista!

Depois de alguns poucos minutos encaramos o nosso primeiro desafio: 8 km de subida (sinuosa). Por volta dos 3 km, Arestides sentiu dificuldades em continuar. Sabíamos que, para ele, os desafios seriam maiores. Resolvemos, Paulo, Chico e eu, ficar acompanhando Arestides. Realmente o nosso mestre demostrou uma incrível capacidade de superação, afinal o garoto não tem 18 anos, mas sim 73! 
Bem, depois de algumas paradas e da marcha lenta, conseguimos chegar no topo, onde nos reunimos com o resto da rapaziada que nos aguardava. 

Percebemos que nuvens se aproximavam e que era indicativo de chuva. Aquele momento a temperatura já havia caído e estava uns 4 graus, além disso estávamos a 840 metros a mais de altitude.

Em pouco tempo a chuva chegou e quase todos haviam colocado suas calças e casacos impermeáveis, além da proteção para os pés. Penso que apenas Arestides e eu não o fizemos. Da minha parte subestimei as inevitáveis conseqüências.

Em pouco tempo já estava tremendo de frio, as mãos e os pés congelados. O mesmo se deu com Arestides. A programação era, ao chegar nos 70 ou 75 km encontraríamos algum abrigo para acampar. Já estávamos, naquela altura, todos com muito frio (pois o vento também era inclemente). O desespero bateu, pois não encontrávamos abrigo e a estrada toda era um deserto e sem lugar para nos proteger, nem ao menos do vento. 

Chegando aos 80km vimos uma ponte e avaliamos que seria viável acamparmos debaixo dela, porém lá era o próprio canal do vento. Eu estava desesperado, pois não sentia mais as mãos e Arestides estava com sinais de hipotermia. Felizmente, nos encolhemos em um canto da ponte e conseguimos amenizar o frio. O problema era que não havia condições de acampar e não tínhamos a mínima chance de prosseguir. O horário também exigia o rancho, pois já eram quase 17h. 
Tomei uma dose de wisck que Paulo me deu e imediatamente  procurei colocar meu casaco, tirar a meia molhada e todo o resto que estava úmido. O mesmo fez Arestides e todos do grupo souberam bem se ocupar dele.
Paulo e Chico localizaram um bom lugar para acampar, próximo da ponte. Havia um barreiro, ao lado da rodovia, que nos protegia do vento e o terreno era plano e com vegetação rasteira. Montamos, então, as barracas, providenciamos a comida e fomos nos recolher, pois a tropa estava exausta desse primeiro dia. Sobre a comida é interessante observar que basicamente rangamos purê de batata em pó e sardinha. Havíamos levado fogareiros pequenos. Bem, pelo menos garantimos proteína e carboidrato.
O problema, para completar, foi o frio, pois a temperatura caiu muito, ceifando abaixo de zero. Felizmente nossas barracas, saco de dormir e manta térmica amenizaram. 
Tentamos dormir, relaxar e ganhar forças para enfrentar o segundo dia.
Ainda durante a noite, com um frio terrível, ninguém se atrevia a sair das barracas. Quando alguém precisava urinar dava seu jeito. Em uma dessas Del, que dividia barraca com Alex, pegou um saquinho para urinar. Após o alívio, se deu conta que o saco estava furado para desespero de Alex. Foi aquela confusão, mas todos, aquele altura acordados, não aguentaram e caíram na galhofa, afinal desgraça pouca é bobagem.
Desse primeiro dia entendemos que há necessidade de sermos mais precisos no que diz respeito às paradas. Avaliamos também que o grupo está bem entrosado, pois vivemos momentos de tensão e soubemos superar e nos entender.




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