O projeto racionalista,
que surge com a modernidade, aposta nos empreendimentos de razão imperial como capaz de
iluminar o mundo e tirar o humano das trevas (daí a ideia do chamado “projeto
iluminista). É nesse contexto que a escola (em seu conceito moderno e que
conhecemos) aparece e por traz dela, todo o sentido de educação (a escola seria
um dos equipamentos da educação).
A educação, portanto, regida pelo
racionalismo daria conta de uma nova ordenação social, instruindo, levando
conhecimento, qualificando, edificando a humanidade... (é claro que há a sacada
de Foucault a respeito da domesticação dos corpos através desse projeto moderno
e como tudo isso estava atrelado a uma nova ordem mundial do capitalismo moderno).
Inúmeras críticas surgiram
a respeito desse projeto racionalista, até porque fracassou sob vários aspectos
(Freud, por exemplo, é um grande crítico da crença da razão como redentora da
humanidade). Apesar das críticas, não sou adepto ao entendimento de uma ruptura
total e um afastamento da razão. Coloco-me próximo as ideias de Morin (2005)
quando este distingue razão de racionalismo.
Aqui,
é absolutamente necessário distinguir razão e racionalização. Esta última é
lógica fechada e desmentidora, que julga poder aplicar-se ao real; quando o
real se recusa a aplicar-se a essa lógica, é negado ou então submetido a ferros
para que obedeça: é o sistema do campo de concentração. A racionalização, apesar
de desmentidora, tem os mesmos ingredientes que a razão. A única diferença é
que a razão deve estar aberta e aceita, e reconhece, no universo, a presença do
não racionalizável, ou seja, o desconhecido ou o mistério (p. 112).
Para mim,
isto significa que ainda necessitamos de escolas, de processos educativos em
geral para trazer novas ordens a sociedade, para ajudar em novas organizações
sociais. É claro que a razão norteadora e inspiradora de processos educativos
deve estar em diálogo constante com outras dimensões humanas que escapem a
própria razão.
No caso da
educação no trânsito é inconteste a necessidade de lançar mão de dispositivos
que reorganizem a sociedade, que conscientizem as pessoas, que criem novas
culturas de respeito, de convivência, de mobilidade urbana, etc.
Em uma das
minhas pedaladas, saí com o propósito de reparar a qualidade do trânsito, dos
aspectos urbanísticos, do comportamento dos transeuntes, etc. Não cheguei nem
na metade do meu parco percurso de 17 km e já havia colecionado uma série de
situações que demonstram o quanto estamos mal educados. Só para citar algumas
cenas: a) cadeiras e mesas de bar tomando parte da ciclovia da orla de
Petrolina; b) reforma no acostamento que dá acesso ao quartel da Polícia
Militar de Pernambuco (em Petrolina) sem espaço para os ciclistas; c) saindo da
Praça da Catedral e virando a direita para a Orla, carros vindo na contra mão
(mesmo sendo faixa dupla contínua separando os lados da pista; d) pedestres e
outros ciclistas sem a mínima noção de direita e esquerda do fluxo nas
ciclovias...
Em uma
dessas situações não me contive. Foi justamente das cadeiras e mesas em parte
da ciclovia (em um dos bares na Orla de Petrolina). Fiquei a pensar como
abordar essa situação. Falaria diretamente com os caras na mesa? Partiria logo
para ignorância? Tiraria fotos (estava com meu celular) de maneira a intimidar
e demonstrar que iria fazer outros tipos de denúncias? Falaria com o
proprietário do bar?
Daí lembrei
de alguns colegas meus da Universidade. Colegas do Sul, Sudeste e mesmo de
capitais nordestinas. Lembrei que se fossem eles já estariam brigando,
indignados. Passei a pensar sobre isso.
Refleti que eles se indignam porque da onde vêm, esse tipo de coisa é inadmissível.
Porém, na nossa região, estamos aquém desse nível de compreensão (diria consciência).
A razão, nesse caso, de agir duramente (até punitivamente) não me pareceu
eficaz. Há de se compreender o nível que nos encontramos. Entretanto, não
significa uma inação ou permissividade (tão nocivo quanto a punição, neste
caso). Resolvi procurar o dono do bar e falei que não era correto aquelas
cadeiras e mesas na parte da ciclovia. O dono do bar me pareceu sincero em sua resposta. Concordou, sorriu sem graça e acenou com a cabeça.
Não sei o
que aconteceu depois, mas penso que esta situação exemplifica o quanto
precisamos dos processos educativos, inspirados pela razão, mas em diálogo com
outras dimensões.
Referência
MORIN, Edgar. Ciência com consciência
Rio de Janeiro: Bertrand, 2005.
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